Blast from the Past: Double Dragon (NES)
Um conto de dois dragões
Double Dragon nasceu nos fliperamas em 1987 pelas mãos da Technos Japan, empresa responsável pelo beat ‘em up Renegade, considerado seu antecessor espiritual. Nos Estados Unidos Double Dragon foi distribuído pela Tradewest, que você deve reconhecer pelo também clássico Battletoads, enquanto na Europa a distribuição ficou a cargo da própria Nintendo.
Se você não sabe, o gênero Beat ‘em up, traduzido livremente como “acabe com eles”, é um estilo de jogo que consiste em… bem, acabar com eles. “Eles”, neste caso, são absolutamente todas as pessoas que têm o azar de cruzar o seu caminho no jogo. O sucesso de Double Dragon é, em grande parte, responsável pela enorme popularização deste gênero no final dos anos 80 e começo dos 90, inspirando inúmeras franquias e arracando milhões de dólares nos fliperamas mundo afora.
Com todo esse êxito comercial, não é surpresa alguma que todos os consoles da época tenham batalhado pelo direito de lançar um port. A versão de Master System foi provavelmente a adaptação mais fiel e tecnicamente precisa da época, mas também tivemos versões para GameBoy, Commodore 64, IBM PC e, acredite, até uma sofrível e risível versão para Atari ST. Não obstante, no Blast from the Past de hoje, vamos relembrar a divertidíssima versão de NES.
Operação dragão: montando as bases do beat ‘em up
Como tudo que faz muito sucesso acaba chamando atenção, não é surpresa que um monte de pessoas pelo mundo tenha ficado escandalizada com o fato da primeira cena do jogo ser uma mulher sendo espancada. tenha em mente que eram os anos 80, e isso foi de um pioneirismo brutal. Chocar na cena inicial acabou virando uma pequena tradição, já que em Double Dragon II a equipe de desenvolvimento tomou uma medida ainda mais ousada e simplesmente decidiu que seria uma boa ideia deixar a Marian ser morta na introdução. Lei Maria da Penha neles, gente!
Toda essa polêmica sobre violência contra mulheres nos beat ‘em ups chegou ao auge com a franquia Final Fight, outra gigante do gênero beat ‘em up inspirada diretamente em Double Dragon. Mas neste caso a Capcom acabou sendo mais esperta e encontrou uma desculpa no mínimo inusitada para justificar mulheres apanhando em seu jogo. A personagem Poison, uma das mais famosas do mundo dos games, é frequentemente descrita como uma transsexual! A primeira vista pode até parecer uma polêmica boba, mas esta história é importantíssima para entender o processo de amadurecimento dos videogames. E é apenas uma das muitas contribuições de Double Dragon à indústria de entretenimento eletrônico.
O grande dragão branco: Billy Lee, o justiceiro solitário
Os irmãos Jimmy Lee e Billy Lee (ou Bimmy Lee, como ele passaria a ser conhecido em Double Dragon III para NES, num dos erros de digitação mais engraçados da história dos videogames. Sério, pesquise sobre isso, vale a pena!) são os tais dragões que dão nome ao jogo. Muito embora o jogo tenha feito sucesso nos arcades justamente pela possibilidade de controlar os dois dragões cooperativamente, na versão de NES só é possível jogar como Billy.
Até há um modo para dois jogadores, mas se trata do sistema de revezamento popularizado na série Super Mario Bros.. Neste caso, os dois jogadores controlam Billy e tentam progredir o máximo possível na fase até perder uma vida. Aí o outro jogador assume o controle. Certamente não é o modo mais legal de jogar cooperativamente, mas a opção está lá.
Há também um tal de “Mode B”, exclusividade da versão de NES, no qual é possível participar de uma luta um contra um no melhor estilo Street Fighter. Este modo pode ser disputado tanto contra um amigo como contra o computador, mas enjoa muito rápido. O ideal mesmo no NES é se aventurar solitário no modo single player mesmo.
Como treinar seu dragão
No modo principal de jogo, como era de se esperar, o controle é simples e eficiente. Um botão desfere socos, outro desfere chutes. Aperte os dois botões juntos e o personagem pula. Infelizmente não há um botão de bloqueio, então sua melhor defesa contra a ofensiva inimiga acaba sendo bloquear golpes com o próprio rosto.Nada esperto, Billy. Felizmente, é póssível apanhar armas pelas fases, o que lhe confere certa vantagem nos combates. Facas, bastões, e até bananas de dinamite estão à disposição e podem causar um belo estrago nos oponentes.
Há também um interessantíssimo sistema de melhoramento de habilidades, no melhor estilo dos RPGs. Quanto mais inimigos você derrota ao progredir no game, mais “experiência” você ganha, o que destranca novas habilidades que podem ser usadas. Pode acreditar, todas elas muito úteis. Minhas favoritas são a voadora e a cotovelada, um golpe particularmente apelão, com o qual é possível abusar do falho sistema de colisão e acertar os inimigos a alguns metros de distância.
Uma aventura curta, mas intensa
São apenas quatro fases, mas elas são divididas em várias pequenas seções, o que garante variedade. O primeiro nível se passa nas ruas de New York e é bem simples, sendo um ótimo terreno para aprender os controles básicos. A segunda fase se passa no que parece ser um pequeno complexo industrial, onde o cenário começa a ficar mais rico, com grades para escalar e abismos para saltar. O terceiro cenário é uma floresta em sua primeira metade, e uma caverna na segunda. É basicamente a parte que separa os jogadores casuais dos mais dedicados, pois quando estalactites começam a despencar do teto e pulos milimétricos precisam ser executados nas pequenas plataformas em movimento, o jogo se torna um verdadeiro teste de paciência.
A última fase se passa no inferno. Mentira, mas bem que parece. Na realidade é o quartel general da gangue dos Black Warriors. E se você é uma das dez pessoas no mundo que consegue passar deste nível, meus parabéns! Aqui há obstáculos cujo padrão de movimento é simplesmente impossível de ser decorado pelo homem médio. Mas se você tem o olho do tigre e treinou arduamente para concluir a fase, recebe uma bela recompensa no fim. Exclusividade da versão de Nintendo, há uma incrível reviravolta no fim do jogo. Após acabar com o último chefe, há… um segundo último chefe! O irmão de Billy, Jimmy, é revelado como o verdadeiro mestre do crime, e o real sequestrador de Marian. Isso que é rivalidade de irmãos, hein?
Faltou um pouco de capricho
Infelizmente, nem tudo são flores no port de NES. Devido às limitações de hardware do console, o máximo de personagens que podem estar na tela ao mesmo tempo é três. Se você prestar atenção, vai reparar ainda que os inimigos sempre vem com o mesmo design, como se o tempo todo você estivesse enfrentando gêmeos ou vendo dobrado. O sistema de colisão e detecção de movimentos também não é perfeito, e isso é sentido principalmente nas fases que exigem mais pulos e habilidades com plataformas.
Ou seja, prepare-se para berrar vários “mas… mas… eu acertei esse pulo! Como que eu morri?” ao longo da jogatina. Ao menos a trilha sonora da versão de NES é fenomenal e compensa esses deslizes. É impossível jogar o game e não passar o resto da vida cantarolando mentalmente todas as faixas da trilha sonora.
Coração de dragão
Mesmo não sendo um primor técnico, Double Dragon marcou a infância de muita gente nos anos 80, e é parte importantíssima da história dos videogames. Um dos jogos beat ‘em up mais amados e influentes da indústria de entretenimento eletrônico. Como é bem difícil encontrar um cartucho do game nos dias de hoje, é ótimo saber que a versão original de NES está disponível no Virtual Console. Se você curtir o jogo, não deixe de jogar a sequência, Double Dragon II, um dos melhores jogos da biblioteca do NES, e assunto para um futuro Blast from the Past.